• Autor Elisa Losada Cerqueira
  • Ano 2018/2
  • Localização -22.708611, -42.609722
  • Orientador Bernardo Soares
  • Resumo

    Rio Bonito, localizado na região metropolitana do estado do Rio de Janeiro, é o objeto de estudo do presente trabalho. A cidade, que conta com cerca de 55 mil habitantes, tem paisagem composta predominantemente por morros e serras que a cercam: o município apresenta 15% de seu território coberto com remanescentes de Mata Atlântica, principalmente nas áreas de relevo mais escarpado na parte norte.. A Serra do Sambê é uma referência geográfica do município - nela encontra-se o ponto mais elevado, com 880 metros de altitude - que se localiza ao norte do município e possui os maiores e mais bem conservados fragmentos de Mata Atlântica. Nesse mapa, essa mancha verde na parte norte da imagem representa toda a área considerada pelo município como área de preservação ambiental. Ao longo dos anos, motivada pela expansão da cidade e, simultaneamente, da exploração de recursos minerais, como argila e bauxita, a paisagem natural vem sofrendo uma serie de alterações. Nessas imagens, mostro essas alterações da paisagem na cidade: Areas protegidas por lei são ocupadas irregularmente, morros são cortados, e o desmatamento avança sobre trechos pequenos e médios de mata que já estão isolados entre si, reduzindo as chances de conexão com fragmentos de vegetação mais extensos, e, portando, ecologicamente viáveis – criando uma forte tendência: a medida que a cidade cresce, ela sobe para os morros de forma indevida. Para ilustrar essa tendência, nessa imagem, podemos ver um morro da cidade que, atualmente, já vem sofrendo com as interferências em sua paisagem natural, e então, é feito essa montagem, que mostra esse espaço sendo completamente ocupado de forma indevida e descuidada. A partir da análise do local, de suas fortes características naturais e suas demandas, iniciou-se uma investigação acerca de como habitar esses morros e serras, tendo como objetivo criar uma nova interação entre os moradores da cidade e a paisagem urbana. Em sua ressignificação da relação entre ser e mundo, Martin Heidegger propõe uma reflexão sobre a articulação entre habitar e construir: não construímos para habitar, mas construímos na medida em que habitamos. Assim, o próprio construir, ou seja, a edificação de construções, que permite a criação de coisas, apenas é possível porque primeiro habitamos o mundo, e assim, tecemos relações de sentido com tudo o que está à nossa volta. Nessa perspectiva, Heidegger observa que, embora "uma ponte, um hangar, um estádio" sejam construções, mas não habitações, estas construções estão no âmbito do habitar, pois elas "oferecem ao homem um abrigo". Em outras palavras, elas constituem o universo de familiaridades com o mundo que o homem cria para si, pois através da ação de construir damos sentido ao mundo e passamos a tecer com ele, pertencimento. Para Heidegger, o pensamento moderno compreendeu o construir unicamente no sentido técnico de produzir e o habitar como um comportamento humano. Porém, no resgate da origem desses verbos nas antigas expressões alemãs, encontramos ressonâncias entre os termos bauen (construir) e buan (habitar). Buan designa permanecer e morar, mas também significa proteger, cultivar e cuidar do crescimento, apontando para a relação entre o ato de construir e a criação e cuidado com um lugar de pertencimento humano no mundo. Do mesmo modo, encontramos ressonâncias entre bauen (construir) e bin (ser), indicando que o próprio existir significa habitar o mundo: designa a criação de laços de pertencimento nas relações com o espaço, com as coisas, com os outros. Em Heidegger, o sentido de morar não está propriamente na casa. Habitar está para além da questão material construtiva, de casa, mas se aproxima da ideia do lar. Ao visitar o local, são despertadas uma série de sensações – físicas e emocionais – que, para Peter Zumthor, são consideradas atmosferas. Segundo o arquiteto, a atmosfera se comunica com nossa percepção emocional, ou seja, uma percepção que acontece de forma instintiva: existe uma compreensão imediata, uma ligação emocional imediata, ou até uma recusa imediata. A sensação só existe enquanto vivemos aquele local. A temperatura amena, o som ensurdecedor do silêncio, a localização acima da cidade: as sensações começam imediatamente ao chegar ao local, assim como terminam quando o mesmo é deixado. A partir daí, inicia-se um processo de pensar uma arquitetura que valorize essas sensações, que as torne acessíveis e que reforce a experiência existencial. Estar imerso à natureza, vivenciando-a e, ao mesmo tempo, buscando criar a relação de pertencimento adquirida ao habitar um espaço que antes não era vivido por todos. Como ponto de partida, com a ideia de inserir o morro na vida urbana, foi proposta uma pequena praça, localizada à margem da Serra do Sambê. Essa nova praça é conectada à uma praça pré-existente, que ganha um novo desenho – nela, atualmente, acontecem uma série de eventos na cidade, como feiras de rua, festas e shows. Essa conexão é feita a partir de traffic calmings, que, por nivelarem o piso, criam uma unidade entre os ambientes, criando um espaço de transição entre o morro e a cidade. Propõe-se então, a criação de uma passarela elevada que tem como ponto de partida a nova praça, e que conduz o usuário por dentro da mata, vencendo as diferenças de cotas e conectando a cidade aos morros, terminando em um ponto onde hoje está localizada uma pista para voo livre. Esse projeto, localizado na Cidade do Cabo, na Africa do Sul é do arquiteto Mark Thomas, e foi usada como referência para o meu projeto. Uma passarela que caminha pelas copas das árvores traduz a ideia de habitar a floresta de maneira suave. Um outro projeto onde podemos ver a mesma ideia é esse, em Londres, do escritório Mark Barfield Archtects. Uma estrutura sinuosa, leve, não intrusiva de aço foi concebida, suportando um deck de madeira feito de ripas, serpenteando o seu caminho através e sobre as copas das árvores. O objetivo foi habitar de maneira suave o morro e as copas das árvores, de uma forma discreta. A passarela é geralmente fina e comprida e alarga-se em alguns pontos, as pausas. Nesses momentos de pausa, que geralmente acontecem em trechos em que a passarela encontra-se plana, foram propostas pequenas estruturas para abrigo e descanso, como podemos ver nessas imagens. Nessa pausa foi proposta essa cobertura tensionada, que funciona como abrigo. Nesse trecho, acontece um vão no centro da passarela, onde é estendida uma rede, que convida o usuário a deitar sob as arvores que cercam a passarela. Os gradientes suaves levantam os visitantes a 10 metros acima do chão em alguns pontos, enquanto em outros, a passarela o toca. Durante o percurso, existem pontos de acesso por meio de rampas e escadas, que conectam a passarela às trilhas pré-existentes. A passarela fica sobre pilares metálicos que estão inclinados, dispostos a adaptar-se às qualidades e especificidades do local, aproveitando o melhor solo, preservando ao máximo a fauna e a flora. Visualmente do chão, os polos estruturais se fundem com os troncos das árvores; a estrutura se funde na floresta. Camuflagem, filiação entre uma obra e seu meio ambiente, o projeto é uma proposta para um caminho de pedestres em harmonia com a paisagem natural. Com o objetivo de aproximar ainda mais o transeunte da mata, ao longo do percurso, a passarela toca o solo, onde encontra pequenos pavilhões que convidam o usuário a experimentar o local, vivenciando-o sob diversos enquadramentos diferentes, proporcionando uma atmosfera que desperta sensações únicas em casa ponto do morro. Nesse mapa, podemos ver a disposição dos pavilhões ao longo do passeio. Vale ressaltar que essa é uma disposição hipotética: a ideia é que esses pavilhões possam ser implantados de maneira progressiva ao longo do percurso, sem nenhuma restritiva localização. O primeiro pavilhão apresentado é O mirante, que materializada uma forma de habitar a floresta. Ele está apoiado por uma estrutura de madeira que repousa sobre o solo, adequando-se a topografia acidentada. Ao descer da passarela, o usuário é conduzido pelo corredor que leva ao mirante, e Ao inserir-se nele, o usuário é capaz de apreender com o olhar a natureza que o cerca. Uma vez imerso na natureza, o visitante encontra abrigo sob a estrutura de madeira que constitui a cabana. Apesar de protegida, a pessoa não perde contato com a atmosfera onde se insere: as vedações translucidas permitem que a natureza esteja presente no refúgio criado pela cabana. Em meio a natureza, a plataforma representa a indeterminação de um espaço. A ausência de invólucro suscita a ideia de um não enquadramento. A estrutura, completamente flexível, ganha sentido nos eventos que nela se apoiam e nas suas inúmeras possibilidades de apropriação. Ao adentrar a estrutura que forma o túnel, o transeunte tem seu olhar direcionado para a perspectiva formada pela sucessão de pórticos que se multiplicam ao londo do eixo longitudinal do pavilhão. No entanto, o enquadramento da paisagem não é tão rígido, uma vez que a união dos pórticos é formada por elementos translúcidos, que permitem que a natureza penetre o ambiente. No pavilhão Espiral, uma sequencia de ripas de madeira dispostas verticalmente, unidas por arcos de circulo, formam um labirinto que, ao induzir a pessoa ao movimento, enquadra a paisagem de uma maneira não estática, mas dinâmica. Na claraboia, ripas de madeiras que se inclinam no intuito de conformar uma janela para o ceu. O usuário é convidado a deitar-se no chão, e assim, terá seu olhar inundado pela floresta que mancha o céu. Por fim, a câmara escura. Uma caixa suspensa por uma leve estrutura de madeira que se insere em meio a floresta: a câmara escura cria uma dual atmosfera, em que o usuário é capaz de se isolar completamente da mata que o cerca, e ao mesmo tempo, sentir-se imerso pela paisagem invertida que inunda as paredes do recinto.


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