• Autor Leandro Oliveira Giles
  • Ano 2017/1
  • Resumo

    Pautado na ideia de gestão cidade-empresa como solução da crise por qual passavam as cidades europeias e estadunidenses na década de 1970, a administração municipal do Rio de Janeiro lançou em 1996 o primeiro Plano Estratégico da cidade, cuja uma das metas era a “revitalização” da zona portuária, concretizada com o lançamento do projeto Porto Maravilha em 2009. Embora o Setor A deste projeto possua zoneamento de uso misto, os empreendimentos predominantes são torres corporativas, em uma região que concentra mais de 37% da oferta de trabalho da metrópole, mas onde apenas 4% reside. Até mesmo os empreendimentos habitacionais reproduzem um velho modelo emancipado da dinâmica da cidade, organizado em sistema de condomínio. Visamos, assim, o estímulo às travessias entre a Rua Sacadura Cabral (limite atual da área residencial e de comércio local da região) ao Boulevard Olímpico, da Praça da Harmonia/Moinho Fluminense à Praça Mauá, esperando impactar metade do setor. Investigamos neste setor uma visão de cidade onde o antigo e o novo, em termos físicos e de presenças sociais, articulem-se na produção dos acontecimentos nos espaços públicos, que acarretam em uma cidade fluida e plenamente frequentada, sem vazios urbanos produzidos pela estratégia de setorização. Por reconhecermos a importância dos equipamentos urbanos, unidades residenciais e a presença de comércio e serviços para público local na consolidação da vida urbana nos espaços das ruas, investigamos como estratégia de recuperação da zona a inserção de um edifício de uso misto, articulando este programa em um terreno estratégico no interior do setor, onde há um par de armazéns construídos no início do século XX e que pertenceram à Companhia Docas. Trata-se de uns dos representantes desta tipologia para a qual a obra de estruturação do Porto foi originalmente realizada. A presença destas edificações afirma a memória da construção deste trecho de cidade e suas transformações, uma vez que seus espaços já haviam sido reapropriados por outros atores que também desempenhavam papéis na produção da cidade. Promovemos a diversificação dos usos, contemplando públicos com diferentes permanências, recorrências e origens, além de uma variação no perfil de unidades habitacionais na contramão dos modelos “emancipados” dos espaços públicos que reforçam a situação de vazio demográfico no interior da região, como os empreendimentos corporativos realizados e em andamento, ou mesmo as propostas de habitação de luxo. Nesse contexto, após análise da região, decidiu-se por inserir um equipamento de abastecimento (supermercado), buscando uma alternativa para inserção do seu programa hermético. Considerando ainda o tripé da sustentabilidade, o concreto armado foi escolhido em função da sua alta empregabilidade e impacto econômico-social neste cenário de crise, que afeta milhares de trabalhadores da construção civil, optando-se pela técnica da laje nervurada a fim de reduzir o consumo de aço e concreto. Seguindo as orientações da Carta de Givoni para conforto higrotérmico no Rio de Janeiro, concebeu-se estratégias de ventilação e iluminação natural para todos os programas a partir do térreo, inclusive prismas de glass channel captadores de ar na cobertura para facilitar a circulação e distribuição de ar nas unidades menos expostas aos ventos predominantes e iluminar naturalmente os corredores. Dessa forma, a concepção do edifício como estratégia de renovação urbana considera que reapropriar o antigo na relação com o novo é afirmar uma visão de cidade em que a construção contínua da paisagem preserva como valor do lugar a presença de diferentes temporalidades e protagonistas dos acontecimentos urbanos, buscando ainda soluções arquitetônicas para melhor desempenho energético e conforto higrotérmico em edifícios de uso misto.


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