Resumo
"Que cidades queremos construir para um mundo em crise? O Cidade-rio parte de uma inquietação profunda com os rumos que a emergência climática impõe ao planeta, ao Brasil e, especialmente, à cidade do Rio de Janeiro. Diante da constatação de que o futuro é cada vez mais indefinido e potencialmente catastrófico, questiona-se o papel da Arquitetura e do Urbanismo enquanto campos que moldam a cidade — e, com ela, os modos de vida — à luz das incertezas planetárias. Na perspectiva de uma transição para futuros mais resilientes, e que superem o discurso sustentável desenvolvimentista, é fundamental rever a maneira como se constituem as cidades brasileiras, e questionar sensivelmente suas relações com a natureza e os seres que a habitam. A pesquisa deste trabalho se estrutura em dois Atos: o primeiro, a partir do entendimento das interações clima-sistema-cidade em tempos de colapso ambiental, investiga as “distopias cariocas”, isto é, os modos como a cidade do Rio de Janeiro tem respondido à crise do clima por meio de narrativas dominantes, pautadas sobretudo pela financeirização despolitizada da Natureza e do espaço urbano. Em contraste, o segundo ato propõe uma reação: a criação de uma utopia carioca, territorializada para o rio Maracanã, construída a partir de suas narrativas marginais - histórias de vida e vivências coletadas ao longo de seu corpo, que oferecem pistas de devires outros para a metrópole, nascidos de suas águas e de suas chuvas. Com base em uma crítica ao modelo clássico de utopia urbana — eurocêntrico, vertical e colonizador, como o de Thomas More (1516) e dos modernos — propõe-se, aqui, uma utopia decolonial, bottom-up, afetiva e situada. Essa abordagem, fundamentada em autores como Monte-Mór e Limonad (2023), entende que a utopia não é um destino ideal, mas um processo, construído coletivamente com os saberes e com as experiências do território. Inspirado por diversos outros autores, mas sobretudo pela orientação da professora Iazana Guizzo e de sua Floresta Cidade, o trabalho adota a cartografia como método de escuta e deslocamento, movimento chave para uma leitura sensível do espaço urbano, permitindo compor com os fragmentos e com as camadas invisíveis desse corpo-rio-território. Assim, torna-se possível sonhar a produção de outras narrativas, de outros imaginários e de outros futuros, para além de tecnocracias ciborgue. Portanto, a partir de referências da ecologia política e da crítica urbana - como diria o filósofo quilombola Nego Bispo (1959-2023) - em ”confluência” com contranarrativas ancestrais e de memória desta terra, propõe-se aqui um exercício de imaginação teórico-projetual utópico, centrado no rio Maracanã, de uma cidade-Rio diferente, marginal, selvagem, e que possa sugerir outros caminhos de adaptação climática e de resiliência urbana, superando discursos tecnológicos ainda à serviço do capital. O que se pretende é provocar, por meio da imagem e da imaginação, uma reação: um convite a reencantar o Rio e a repensar profundamente suas práticas espaciais num contexto de crise ecológica global. Assim, o Cidade-rio nasce como um gesto de esperança por dias melhores, e de que nos unamos para construí-los coletivamente. Da esperança que escolhamos sempre para onde podemos ir, e que não aceitemos os destinos para onde somos levados. Nasce simplesmente da esperança de que o Rio de Janeiro, e de que nós, rios que somos, como esses seres, possamos ser mais resilientes, mais adaptáveis e reaprendamos a fluir."
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